Quando meu filho tinha três anos de idade, li para ele “O livro eu te amo”, de Todd Parr. O texto diz coisas como: “eu te amo quando você está triste”, “eu te amo quando você está feliz”, “eu te amo quando você tem medo”, “eu te amo quando você tem coragem”, “eu te amo como você é…”
Tudo ia bem, até eu ler esta frase: “eu te amo como você é”. Ele fechou o livro com certa raiva e me respondeu: “não ama, não!”. Tomei um susto, mas não consegui argumentar. Meu filho estava parcialmente certo. Há amor sem aceitação?
Eu o amava, mas achava que ele poderia ser mais seguro, menos chorão; que poderia dormir à noite toda (e eu, consequentemente, também), que poderia ser mais simpático, enfim, que poderia ser um pouco mais o que eu esperava do ideal de filho.
Reinvenção
Após cinco anos – período no qual trabalhei, em uma constelação, a dor de um amor interrompido por eu mesma não ser o ideal de filha, por me dar conta dos amores interrompidos de minha mãe (o pai morreu quando ela tinha quatro anos e sua primeira filha morreu no parto) – algo se iluminou em mim, não de repente, como uma luz que se acende no escuro e faz doer os olhos. Iluminou-se como quando amanhece: uma escuridão que se rende suavemente aos raios do sol e pode, então, revelar horizontes.
Os fios de energia e amor, ainda que momentânea ou cronicamente interrompidos, estão todos dentro de nós. Basta querermos reconectá-los.
Há poucas semanas, nesse estado pleno de reconexão com minhas origens, sentei-me com meu filho e contei a história do livro. Percebi seus olhinhos ficando timidamente úmidos. Então, pude afirmar: “agora, sim, com toda a verdade da minha alma, eu te aceito e amo como você é: com riso ou choro, medo ou coragem, bravo ou alegre, com cheiro bom ou chulé.”
Ele riu alto, correu para o quintal e voltou com uma flor pequena, delicada. Era a primeira vez que ele me dava uma flor. Vi que algo nele também amanhecia.
Amor interrompido
Certas situações na infância podem ter-nos levado a acreditar que não tivemos o amor de nossa mãe e/ou de nosso pai. Ou porque ficamos impossibilitados da presença deles (como no caso de uma internação, adoção etc.) ou porque, devido aos próprios emaranhamentos, eles não estavam disponíveis emocionalmente para nós.
Esse é um sentimento profundamente doloroso (mesmo que não tenhamos consciência dele), como se o fio que nos liga à fonte de onde viemos fosse cortado.
Bert Hellinger chamava esse processo de “amor interrompido”. Para ele, quando não fazemos a reconexão com nossos pais, podemos seguir repetindo essa mesma experiência de amor interrompido nos demais relacionamentos da vida adulta. Começamos uma relação afetiva e, antes que o vínculo se estabeleça, ela se rompe.
É preciso, antes de caminhar para a vida, nos reconectarmos com a fonte. Você pode fazer esse movimento. Por meio do curso de Constelação Familiar – Introdução à Visão Sistêmica, você poderá compreender como trilhar esse caminho de reconexão.
Por Adriana Bernardino.
Emocionante !
Olá Maria de Lourdes, bom dia! Tudo bem com você?
Gratidão por acompanhar nossos conteúdos e dividir conosco o seu sentimento!
Pode haver amor interrompido no sentido oposto? Ou seja, de filho para uma mãe? O filho rejeitar o amor da mãe, por esta não ter estado disponível? E quando levamos esse sentimento para os relacionamentos e tomamos o mesmo comportamento em relação às outras pessoas, não estarei num movimento de amor interrompido?
Olá Lina, boa tarde! Tudo bem?
O movimento interrompido acontece dos filhos em direção aos pais. E, como você observou muito bem, seguimos repetindo essa interrupção em outras relações. Veja o que Bert Hellinger diz sobre isso no livro “A cura” (ed. Atman):
“Após o trauma da separação de nossa mãe como criança, permanecemos imóveis diante dela. Ao invés de ir até ela, mantemo-nos afastados. Não desejamos vivenciar novamente a dor da separação. Qual foi a consequência? No futuro, permanecemos afastados também em outras relações. Desejávamos nos aproximar de outras pessoas, assim como desejávamos, antes da dor da separação, aproximar-nos de nossa mãe. Contudo cada passo que dávamos em direção a elas trazia, em nosso corpo e em nossa alma, a lembrança da dor da separação, armazenada profundamente em nós.”
Não tenho dúvida que nos constituímos por meio de tudo que veio antes e do que se faz presente na nossa vida.
Ainda assim, pergunto-me: mas quem não teve seus fluxos de paixão interrompidos?
Chego a pensar que as interrupções, assim como a falta, a frustração, agrega na estrutura de um desenvolvimento que vai se ajustando à vida, que também é o que nos descola de um conforto para outros espaços de desenvolvimento pessoal.
Se tomo isso como premissa, está tudo bem em relação às interrupções que vamos suportando em nosso campo de informações conquanto possamos nos equilibrar com a alegria e prazer de viver no mundo.