“eles vão

como se nada tivesse acontecido

eles voltam

como se nunca tivessem ido

fantasmas

(“O que o sol faz com as flores”, Rupi Kaur)

Em tempo nenhum os relacionamentos foram fáceis. E os desafios de nossa era digital não deixam nada a desejar em complexidade. Lidar com o que sociólogo polonês Zygmunt Bauman chamou de amor líquido, ou seja, encontros que se fazem e se desfazem como se nunca tivessem existido, tem desanimado muita gente a investir em uma relação. 

Com o amor líquido, surgiram também novos termos para nomear as etapas de sua curta duração: ghosting, haunting, submarining etc. Eleita uma das palavras de 2015 pelo dicionário Collins, ghosting, por exemplo, é usada quando um dos parceiros desaparece sem dizer uma palavra ao outro. O popular “dar um perdido”, sumir, como estratégia de separação.

Quem são, onde vivem?

O ghosting se tornou um fenômeno e levou estudiosos a tentarem entender por que alguém simplesmente desaparece da vida de outra pessoa sem um fechamento que simbolize o término, etapa tão necessária para que novos começos mais saudáveis sejam possíveis.

Pesquisas realizadas com diferentes perfis de pessoas revelaram que o tipo “esquivo” (que evita se apegar ao parceiro) é o que mais usa o recurso do desaparecimento. Não confia no outro, teme a dependência afetiva e o abandono. 

Ainda segundo essas pesquisas, um número considerável de pessoas que sofreu com o ghosting do parceiro passou a agir da mesma maneira em futuros encontros. Elas aparentemente não mostraram sentimentos de empatia, culpa ou responsabilidade pelo outro. 

O que foi que eu fiz de errado?

Para a Eliane Dell Omo, psicóloga e consteladora do Instituto Koziner, uma das piores consequências para quem sofre esse tipo de ruptura, além da tristeza, é o sentimento de inadequação e de rejeição.

“É difícil evitar esses sentimentos quando somos tratados dessa maneira. Há, nessa postura, uma coisificação do outro, uma objetificação que fere a autoestima”, explica a consteladora. “Se aceitarmos que essa pessoa não tem condição de ter um vínculo, ficará mais fácil entender que não há nada errado em ser como somos.”

Consequências sistêmicas e lealdade

No campo dos relacionamentos, uma das dinâmicas observadas por Bert Hellinger, criador das constelações familiares, é a de que não há vítimas, portanto também somos responsáveis pelos encontros e desencontros que vivemos. Nesse caso, a pergunta que pode ser o fio de Ariadne para sair do labirinto das repetições é:

O que, consciente ou inconscientemente, leva-me a viver uma relação de abandono?

Dell’ Omo sugere que também nos perguntemos: será que eu realmente quero me vincular a alguém? Será que realmente dou um lugar a outra pessoa na minha vida? Ou situações como a do ghosting só me “ajudam” a perpetuar o padrão de, por exemplo, mulheres/homens abandonados no meu sistema familiar?

Para Bert Hellinger, esse afastamento pode remeter ao amor interrompido com a mãe. Quando isso acontece, segundo ele, ao invés de nos dedicarmos a nós e aos outros com amor e respeito, afastamonos dele:

O movimento em direção à mãe, interrompido precocemente, tem amplas consequências para a vida posterior e para nosso sucesso. Como isso se mostra em detalhes?

Mais tarde, quando essas crianças se tornam adultas e querem ir em direção a alguém, por exemplo, a um parceiro, seu corpo se lembra do trauma da separação precoce. Então se detêm internamente em seu movimento em direção a ele. Em vez de se dirigirem ao parceiro, ficam esperando que ele venha em sua direção. Quando ele realmente se aproxima, porém, elas, frequentemente, têm dificuldade de suportar sua aproximação. Rejeitam-no de uma ou de outra forma, ao invés de o receberem felizes e tomá-lo. Sofrem com isso, mas, mesmo assim, só podem se abrir para ele hesitantes e, quando fazem isso, muitas vezes o fazem só por um curto espaço de tempo.

(Bert Hellinger in Êxito na vida, êxito na profissão”.  editora Atman)

Resgatando o essencial

Se você acabou de passar por um ghosting, a meditação abaixo, conduzida pela consteladora Eliane, pode ajudar você a se reconectar consigo mesmo e dar os passos necessários para reencontrar a sua força.

 

Por Adriana Bernardino.