“Muita gente julga que o amor tem o poder de superar tudo, que é preciso apenas amar bastante e tudo ficará bem (…). Para que o amor dê certo, é preciso que exista alguma outra coisa ao lado dele. É necessário que haja o conhecimento e o reconhecimento de uma ordem oculta do amor.”

Bert Hellinger

Bert Hellinger, além de terapeuta é um pensador e pesquisador magnífico.

No alto de seus 91 anos conseguiu atingir uma grande percepção e sabedoria a respeito da alma humana.

Descobriu ao longo de 30 anos de trabalho, de maneira determinada, séria e devotada, uma série de leis ocultas que atuam sobre as pessoas, grupos, famílias e até nações.

Essas leis vem sendo ignoradas por toda a história da humanidade, causando grandes distúrbios, conflitos e dores em uma escala individual e coletiva.

A primeira lei se refere à pertinência: Todos têm o igual direito de pertencer. Sobre ela já falei em um outro artigo: ver aqui.

A segunda lei se refere ao equilíbrio entre dar e tomar.

A ela me referirei em neste artigo.

Ordem do Dar e Tomar

Mantém o equilíbrio e o vínculo das pessoas do sistema familiar. Para haver equilíbrio é preciso haver troca, quando não há troca desestabiliza-se a relação dos integrantes do sistema e também traz emaranhamentos.

Quando gostamos de alguém temos vontade de dar ou de fazer algo para a pessoa.

Quando fazemos, ficamos felizes, porque é mais uma forma de demonstrar nosso amor. Quem recebe o presente fica feliz, mas com a sensação que deve algo.

Mobilizado por essa sensação, ela quer dar algo maior.

Aquele que recebe ou toma, fica feliz por ter recebido algo maior, e dá novamente.

Cada vez vai confiando mais nessa relação, se dando e permitindo receber mais, o que torna a relação mais profunda, próspera e rica.

Quando damos algo a alguém, esta pessoa fica feliz, mas se retribui menos ou não retribui isso começa a gerar algo na pessoa que não retribuiu.

Exemplo: Empresto um dinheiro e a pessoa no dia de devolver não o faz, isso gera culpa em quem deve, que começa a evitar o credor, pois se sente desconfortável, devedor e uma posição a baixo.

Evita o credor e começa a fugir. Se o credor começa a cobrar, o devedor se sente pressionado, humilhado e até começa a ter raiva e falar mal do credor.

Essa é uma dinâmica possível de presenciar nas relações: chefe e funcionário, amizades, casais, pais e filhos.

Não saber tomar

Há pessoas que só sabem dar e não sabem receber. Só sabem se colocar por cima, já que dar, lhes proporciona uma imaginaria sensação de superioridade.

Pessoas que normalmente não conseguem receber é porque não sabem dar.

Exemplo: “Eu não quero mais receber”.

Este mecanismo surge por culpa, por dever algo e não conseguir retribuir. Está fazendo algo grave quando não quer receber, está interrompendo a troca e isso faz com que se sinta só e deprimida.

Com esta ação há a perda do direito de receber. O bom seria começar a dar, tornando o direito de começar a receber novamente.

Tão grave quanto não dar é dar em excesso.

Para que o mecanismo da troca siga funcionando é necessário dar só aquilo que o interlocutor tem capacidade de tomar e retribuir, do contrário está colocando ao outro em uma posição inferior.

A falta de equilíbrio entre dar e receber nos casais

Observamos frequentemente em nossos workshops de Constelações Familiares, a falta de equilíbrio entre dar e receber nos casais.

No casal pode existir amor, mas a falta de equilíbrio na troca pode acabar com a relação. Sabemos internamente se somos credores ou devedores.

Desequilíbrio no Dar e Tomar entre pais e filhos

Bert Hellinger observou algo diferente na família. E entre pais e filhos esse equilíbrio é desproporcional, pois recebemos dos nossos pais o que é maior: a própria vida.

Não temos como retribuir na mesma dimensão.

Na maioria das vezes os pais são doadores e não temos como compensar as noites sem dormir, a criação, o investimento financeiro, os cuidados, a comida, o conforto, o estudo.

Isso é algo que como filhos não temos como retribuir. E os pais fazem isso por amor, por 10, 20, 30, 40 anos. Como fica esse filho?

Eternamente culpado porque é um devedor. Se não encontrou a forma de devolver tudo isso, sente-se culpado, se afasta, cria-se sentimento de raiva e também pode falar mal.

Para não se sentirem mais culpados, os filhos negam o que lhes é dado para não se sentirem ainda mais em débito com os pais, o que faz com que esses pais sintam-se rejeitados.

Para aliviar, devem agradecer pela vida e por tudo que receberam dos pais!

Escrevi sobre isso no meu artigo “As Ordens do Amor no relacionamento entre pais e filhos”.

Há diferença entre dizer que respeita e respeitar. Respeitar verdadeiramente os pais não é apenas não falar mal.

O verdadeiro respeito não tem a palavra “mas…”.

Também não é respeito querer salvar ou aliviar o destino dos pais.

Outras vezes os filhos se sentem mal e acreditam que o pai deve dar a eles mais isso ou aquilo e começam a cobrá-los.

Querem mais: “Você não deu um abraço naquele dia”, “Não foi no jogo da escola”, “Fui fazer um carinho e você se afastou”, “Não me deu aquele vídeo game”, “Estava triste e você não percebeu”. Essas ações aumentam o débito.

Quando um filho não aceita os pais do jeito que são, normalmente querem alguma coisa além do que eles já deram.

Estão olhando para aquilo que lhes falta e não para aquilo que receberam, e isto é “não reconhecimento” de tudo que recebeu, desvalorizar, uma atitude de arrogância e desprezo.

É se colocar por cima dos pais.

Quando isso acontece os pais têm a sensação que nada que fizeram teve valor, sentem isso como desrespeito e passam a olhar para esses filhos de uma forma um pouco mais dura, isto reforça o descontentamento.

Como retribuir A VIDA que recebemos de nossos pais

Os filhos precisam saber dizer: “Eu cresci inclusive com aquilo que vocês não me deram, e está bem assim”.

Bert Hellinger descobriu que os filhos, com essa sensação de débito, estão constantemente buscando um equilíbrio para se sentirem aliviados.

Quando a criança não encontra esse mecanismo desde criança pode não querer receber mais nada dos pais. Às vezes sai de casa e tem a sensação que assim vai começar a pagar as dívidas, mas isso só faz este filho se sentir só.

Ilustro esta situação através de um vídeo, no meu canal YouTube. O vídeo se denomina sobre Pais & Filhos. Nele conto um conto denominado “Onde estão as moedas”, do colega Joan Garriga.

Um pai que se sente aceito e respeitado não olha duro.

Então o que falta não é fazer algo aos pais e sim “respeitar”, agradecer e reconhecer. Desta forma se sente retribuindo de fato, e os pais não recebem o que você fez, mas o que reconheceu!

Quando sentimos culpa, sofremos e nos punimos e então entram os processos de sabotagem e autoagressão, que vão desde coisas muito simples até a morte.

Exemplo: Não se permitir ser feliz no amor, não ter prosperidade profissional e financeira, desenvolver doenças, depressão, não usufruir as coisas boas, não se permitir realização sexual, conforto, levando até a morte/suicídio.

Muitas vezes as coisas não fluem por causa disso, porque este filho não encontrou uma forma de retribuir aos pais seu débito, que é a própria vida.

Existem pessoas com condições maravilhosas, dinheiro, família, saúde, mas que se sentem deprimidas e sós, porque não sabem retribuir da forma correta: reconhecendo e respeitando.

A retribuição ocorre através da expressão do seu amor por seus pais:

Eu amo vocês pai, mãe.Eu recebi muito, recebi a vida,A manutenção da vida e isso é tudo.E sou muito grato!

Aceitar os pais e sua história

O respeito está ligado à hierarquia, que significa não julgar, não interferir no casamento deles, não tentar mudar o jeito deles, tomá-los no coração como são, com qualidades e defeitos, porque eles também são frutos de casamentos comuns, cheios de conflitos e emaranhamentos.

Toda pessoa quando criança acha que os pais são perfeitos, mas quando crescem veem que não são e querem transformá-los em perfeitos, sábios, amorosos e acreditam saber todas as respostas que os pais necessitam.

O filho que criticava o casamento dos pais pode ter como consequência não conseguir um relacionamento afetivo.

“Carregamos aquilo que rejeitamos.”

Mario Koziner

A raiva, de uma forma geral, é um sentimento secundário, e esconde um sentimento mais profundo, esconde que é devedor. Atrás da raiva existe a culpa porque não pode devolver A VIDA que recebeu, e desta forma se sabota.

Hellinger diz que quando a pessoa consegue devolver em gratidão, essa balança se aproxima do equilíbrio e, ao casar e gerar um filho, dando amor a esta nova geração, a balança se equilibra.

Na Constelação Familiar observamos que pessoas, que não querem ou devido a alguma impossibilidade não podem ter filhos, podem fazer isso doando algo para pessoas ou grupos, e vivem desta forma também um sentimento de plenitude.

Aceitar o destino dos filhos

Em relação aos filhos, os pais têm uma grande responsabilidade, mas também não podem salvá-los. É fantasia infantil dos pais, mesmo com os filhos crescidos, acharem que podem salvá-los.

É preciso que esses pais vejam a força de seus filhos para enfrentarem o seu destino. Os pais precisam saber entregar seus filhos aos seus destinos, isto é uma atitude de respeito.

Eles precisam deixar de se arrogar deste falso poder e se entregar a algo maior.

Gerar um filho é dar vida a algo maior que é uma continuidade das gerações anteriores.

“Vossos filhos não são vossos filhos. São os filhos e as filhas da ânsia da vida por si mesma.”

Khalil Gibran

Cobrar dos filhos

Nas situações que os pais cobram os filhos, geralmente refletem uma dinâmica de não se sentirem reconhecidos, amados e recompensados na sua própria história de vida.

Cobram, exigem e muitas vezes, tentam controlar a vida dos filhos.

Outro evento é quando um pai perde seu pai muito cedo ou quando há rompimento de relacionamento. Ele busca muitas vezes no casamento (na esposa ou no filho), o seu pai.

Esse filho percebe isso cedo e quer cuidar dele. Este pai cobra do filho e o olha não só como filho, mas como um ponto de segurança. Isso é um emaranhamento.

Os pais que sentem muita culpa por este desequilíbrio na relação de troca com seu próprio pai, ao terem filhos se matam de trabalhar, dão tudo aos filhos.

Muitas vezes estes filhos vão cobrar: “Você deu tudo, eu queria era um abraço”. Isto ocorre porque na verdade este pai não equilibrou a troca no coração e está repetindo novamente a dinâmica:

Pais que tiveram problemas com seus pais repetirão esses problemas com os filhos.

A Constelação está ao serviço de mudanças evolutivas no Sistema Familiar

Filhos adultos podem interromper esse processo, retribuindo para o pai com um agradecimento, como acontece nas Constelações Familiares, quando se consegue desemaranhar situações que veem se arrastando por gerações.

Não adianta a retribuição para os outros, porque isso é uma força que está a serviço do grupo familiar, a força que cuida para que essa família vá em frente.

A pessoa pode ser grande doadora, amar todos, mas se não retribuir aos pais, o fluxo de amor está interrompido e os filhos dela também se voltarão contra ela.

Os filhos quando recebem dos pais a vida, também não podem acrescentar-lhe nada, nem deixar de lado ou recusar algo dela. Pois os filhos não somente têm os seus pais, eles são os seus pais.

Eles são 50% seu pai e 50% sua mãe.

Tomar os Pais é Tomar a Vida assim como se apresenta

Faz parte portando da ordem do amor que o filho tome sua vida tal como os pais a dão, como uma totalidade, e que tome seus pais como eles são, sem qualquer outro desejo, sem recusa e sem medo.

Esse ato de tomar é um ato de humildade.

Significa meu assentimento à vida e ao destino,tal como me foi predeterminado através de meus pais.Aos limites que me foram impostos,às possibilidades que me foram dadas,aos enredamentos no destino da minha família,na culpa, ou no que haja de pesado e de leve.Seja o que for, eu o acolho no meu coração.

https://institutokoziner.com/mario-koziner/