Muita gente supõe que, se nós amarmos bastante, o amor triunfará e tudo se transformará em bem. A experiência demonstra que isto não é verdade.
Às vezes, os pais veem desesperadamente como os seus filhos, embora profundamente amados, tornam-se diferentes do que eles esperavam, por vezes adoecendo, viciando-se em drogas ou suicidando-se.
Tais experiências mostram que, para além do amor, é necessário algo mais para que a vida seja bem-sucedida.
O que o amor requer é que nós compreendamos e sigamos as escondidas Ordens do Amor.
Ordem e amor
O amor preenche o que a ordem abarca.
O amor é a água, a ordem é o jarro.
A ordem reúne,
o amor flui.
Ordem e amor atuam unidos.
Como uma canção obedece às harmonias,
o amor obedece à ordem.
E, como é difícil para o ouvido
acostumar-se às dissonâncias,
mesmo que sejam explicadas,
é difícil para a alma
acostumar-se ao amor sem ordem.
Alguns tratam essa ordem
como se ela fosse uma opinião,
que eles podem ter ou mudar à vontade.
Contudo, ela nos é preestabelecida.
Ela atua, mesmo que não a entendamos.
Não é inventada, mas descoberta.
Nós a depreendemos,
como ao sentido e à alma,
por seus efeitos.
Bert Hellinger
Muitas destas ordens estão escondidas e nós não podemos observá-las diretamente. Trabalham profundamente na alma, e tendemos a obscurecê-las com as nossas crenças, objeções, desejos ou ansiedades.
Necessitamos entrar profundamente na alma, se quisermos tocar as Ordens do Amor.
Aceitar nossos pais assim como são
Quando os pais dão a vida, agem de acordo com o mais profundo da sua humanidade. Enquanto pais, exatamente como são, dão-se aos seus filhos.
Não podem adicionar nada ao que são, nem deixar de fora qualquer coisa. Pai e mãe, consumando o seu amor um pelo outro, oferecem aos seus filhos tudo o que são.
Assim, a primeira das Ordens do Amor entre pais e filhos é que os filhos tomam a vida como ela lhes é dada.
Uma criança não pode deixar nada de fora desta vida, e o desejo de que ela seja diferente não altera coisa alguma.
A criança é dos seus pais. Para que o amor tenha sucesso nesta relação, um filho deve aceitar os pais tal como são, sem medo e sem imaginar que poderia ter pais diferentes.
Afinal, pais diferentes teriam filhos diferentes e nossos pais são os únicos pais possíveis para nós. Imaginar qualquer outra possibilidade é uma ilusão.
Aceitar os pais como são requer um movimento interno muito profundo. Implica o nosso acordo com a vida e o destino, exatamente como nos são apresentados por eles.
Com as limitações que são inerentes a isso, c om as oportunidades que damos a nós próprios, com o enredo no sofrimento, má sorte e culpa da nossa família, ou sua felicidade e boa sorte, tal como pode acontecer.
Essa aceitação expressa a nossa prontidão para frustrar falsas expectativas, que excedem ou caem, de acordo com a vida que os nossos pais nos deram realmente.
Aceitar a vida como ela é
Esta aceitação estende-se para além dos nossos pais, e assim, ao aceitá-los, devemos ver para além deles, à distância, de onde a própria vida vem, e devemos curvar-nos perante o mistério da vida.
Quando aceitamos os nossos pais tal como são, reconhecemos o mistério da vida e submetemo-nos a ele.
Você pode testar o efeito desta aceitação na sua alma, imaginando-se curvado perante os seus pais e dizendo lhes: “A vida que vocês me deram veio para mim ao preço total que vos custou.
Eu aceito-a com tudo o que vem com ela, com todas as suas limitações e oportunidades.”
No momento em que estas frases são sinceramente ditas, nós reconhecemos a vida como ela é e nossos pais como são.
O coração abre-se. Quem quer que pronuncie de corpo e alma esta afirmação sente-se pleno e em paz.
Compare o efeito desta afirmação com o seu oposto, imaginando-se a afastar-se de seus pais, dizendo: “Eu quero pais diferentes, não gosto de como os meus são.”
Que ilusão! Como se fosse possível ser quem somos e ter pais diferentes.
Aqueles que falam em segredo esta frase, afastam-se da vida como ela é, sentem-se vazios, sem apoio e não encontram paz com eles próprios.
Algumas pessoas temem que se aceitarem os seus pais tal como são, devem também aceitar o lado mau deles, e agem como se pudessem escolher somente a parte da vida que preferem.
Temendo aceitar a totalidade da vida, se perde também o que é bom. Aceitando os nossos pais como são, aceitamos também a plenitude da vida, tal como ela é.
O Dar e Tomar
Além de nos dar a vida, os nossos pais dão-nos também outras coisas. Alimentam-nos, animam-nos, cuidam de nós e muito mais.
Isto funciona bem quando a criança aceita o que lhe é dado, tal como lhe é dado.
Naturalmente há as exceções que nós todos compreendemos, mas, regra geral, o que os pais dão aos seus filhos é o suficiente.
Os filhos não podem ter tudo o que querem e nem todos os seus sonhos são realizados.
É consistente com as ordens do amor quando os filhos dizem aos seus pais: “Vocês deram-me bastante e é suficiente; aceito isso de vocês com apreciação e amor”.
Um filho que diga isso, sente-se cheio e próspero, não importa o que possa ter acontecido antes.
Tal filho poderia adicionar: “Eu cuidarei do resto”, que também é uma bonita experiência, e ainda: “Agora os deixo em paz.”
O efeito destas frases é muito profundo. Os filhos têm os seus pais, e os pais têm os seus filhos. São simultaneamente separados e tornam-se independentes.
Os pais terminaram o seu trabalho, e os filhos são livres para viver as suas vidas, com respeito para com seus pais, sem serem dependentes deles.
Mas sinta o que se passa na alma familiar quando você imagina os filhos dizendo aos seus pais: “O que vocês me deram, primeiro, não foi a coisa certa, e segundo, não foi o suficiente. Vocês ainda me devem.”
O que é que os filhos recebem dos seus pais quando sentem desta maneira? Nada. E o que é que os pais recebem dos seus filhos? Nada também.
Tais filhos não podem separar-se dos seus pais. Suas acusações e pedidos os amarram e, embora estejam limitados uns aos outros, não há nenhum progenitor.
Sentem-se, então, vazios, necessitados e fracos.
Esta é a Ordem do Amor denominada “Dar e Tomar”. Que os filhos tomem o que os seus pais lhes dão para além da vida como ela é.
Herança, dádiva ou direito?
Adicionalmente à vida que os pais dão aos seus filhos, e ao que quer que seja que lhes dão enquanto os criam, há também os presentes ofertados a partir do que acumularam com os seus próprios esforços.
Por exemplo, uma mãe é uma excelente pintora que pinta os quadros mais maravilhosos. Isto pertence a ela e não aos seus filhos.
Se os seus filhos ficam decepcionados porque não conseguem pintar quadros tão belos, embora não tenham o seu talento e não trabalhem tão arduamente como ela, eles violam as Ordens do Amor.
O mesmo aplica-se à riqueza material. Os filhos que se sentem herdeiros da riqueza dos seus pais e ficam decepcionados quando não o são, danificam as ordens do amor.
Se herdarem a riqueza, o amor só estará bem servido quando a tratarem puramente como uma dádiva e não como um direito.
A terceira Ordem do Amor entre pais e filhos é respeitar o que pertence aos nossos pais e permitir que façam o que somente eles podem e devem fazer.
Hierarquia
Este princípio se aplica também à culpa pessoal dos nossos pais. Suas culpas pertencem somente a eles.
Frequentemente os filhos tomam a culpa dos pais e tentam carregá-la, mas isto viola as Ordens do Amor.
Quando os filhos tentam expiar os erros dos pais, colocam-se acima deles e os tratam como se fossem crianças que necessitam ser cuidadas, como se os seus pais fossem, na verdade, os seus filhos.
É uma tentativa presunçosa de fazer algo que não se tem direito nenhum de fazer.
Não há muito tempo, em um grupo de formação para facilitadores em Constelações Familiares que eu coordenava, uma mulher queria constelar porque tinha dificuldades em suas relações afetivas, não conseguia manter um relacionamento estável.
Sentia que necessitava cuidar dos seus pais, que já estavam avançados em idade.
Quando nós configuramos a sua constelação familiar, o seu representante agiu como se fosse grande e seus pais pequenos.
Na constelação, a mãe disse-lhe: “Nós somos os grandes e você é a pequena”. E o pai: “Você é nossa querida filha”.
Mas a mulher ficou mais decepcionada do que aliviada, pois foi reduzida ao tamanho de filha, de criança.
No decorrer da constelação, quando conseguiu aceitar sua posição na estrutura familiar, sentiu-se livre para seguir sua vida.
Tomando e desafiando
A quarta Ordem do Amor entre pais e filhos é: os pais são grandes e os filhos são pequenos. É apropriado que os filhos tomem e os pais deem.
Porque os filhos recebem tanto, têm necessidade de balancear a conta. Faz-nos sentir incomodados quando aceitamos daqueles que amamos sem poder retribuir.
Com os nossos pais nunca podemos corrigir o desequilíbrio, porque eles dão sempre mais do que nós podemos retribuir.
Alguns filhos fogem da pressão da reciprocidade, da sensação de obrigação ou de culpa. Então dizem: “Eu prefiro não receber nada e sentir-me livre da culpa e da obrigação.”
Tais filhos fecham-se aos seus pais e sentem-se vazios e empobrecidos.
O amor seria melhor servido se eles dissessem: ” Aceito, com amor, tudo o que me derem .”
Então poderiam olhar amorosamente para os seus pais, e os pais poderiam ver como os seus filhos eram felizes.
Esta é uma maneira de aceitar que consegue equilibrar, porque os pais sentem reconhecimento por este tipo de aceitação, com amor. E dão ainda de maior boa vontade.
Quando os filhos exigem: “Vocês devem dar-me mais”, então os corações dos pais fecham-se. Quando os filhos exigem, os pais não podem mais inundá-los voluntariamente de amor.
É tudo o que essas exigências conseguem: elas proíbem o fluxo natural do amor. E os filhos exigindo, mesmo quando conseguem algo, não lhe dão valor.
Reciprocidade
Entre pais e filhos, a reciprocidade em dar e receber é conseguida quando os filhos dizem: “Eu recebo tudo o que me dás e passá-lo-ei para os meus filhos e ou minhas obras”.
Os filhos não olham para trás quando recebem desta maneira, eles olham para frente.
Constelações Familiares
Como facilitador de Constelações Familiares, percebo a pessoa “como um todo” (corpo-emoções – mente-espírito), inserida em um sistema familiar com uma história que traz um significado, um sentido a ser recuperado.
Um precioso tecido que pode ser reconfigurado, um mistério que pode ser revelado, um sofrimento que pode ser solucionado ao encontrar o livre fluxo da vida, pulsando por gerar mais conexões consigo mesmo, com os outros e com o mundo.
A partir de um tema que o consultante deseja solucionar, uma constelação pode revelar a origem de um sofrimento e mostrar uma forma de libertação ou solução, que lhe permita reconectar o fluxo evolutivo do seu sistema familiar e recuperar alguma ordem que tenha sido interrompida.
Reconfigurando a ordem em uma Constelação Familiar
Uma das ordens que mais frequentemente observo interrompida ou bloqueada é a de “Tomar os pais”.
Há pessoas que consultam sentindo-se deprimidas ou empobrecidas internamente, sem força para atingir suas metas de vida ou sem motivação para identificar e realizar seus sonhos.
Às vezes, sem clareza suficiente até para reconhecer qual é seu sofrimento. Sem “estrutura”, porque todo projeto que começam, dura um tempo e logo algo se derruba interna e externamente.
Estas pessoas são acompanhadas por uma espécie de “radioatividade” que acaba destruindo tudo.
Muitas vezes,se irritam com facilidade, sentindo-se vítimas “da injustiça com que a vida as tem tratado”, reclamando especialmente de seus pais e de como foram tratadas por eles.
Relacionamentos, projetos pessoais e profissionais acabam entrando em uma espécie de buraco negro hospedado em sua alma.
Tenho observado que esse buraco negro só pode ser preenchido com a força da vida que vem através dos pais, quando, na constelação, a pessoa se abre para “aceitar os pais” com suas luzes e sombras, quando consegue abrir o coração para a vida que veem através dos pais e agradece por isto.
Quando consegue reverenciar à vida e a seus pais, esse buraco começa a gerar uma espécie de tecido conectivo, a formar uma cicatriz.
Se reconfiguram os fios do tecido dentro da alma individual e familiar.
Assim, a força de vida consegue fluir por uma trilha que faz recobrar um brilho no olhar, um vigor no semblante.
Emerge, assim, a sensação interna de um novo amanhecer, um novo campo de possibilidades e uma nova direção: tomar a própria vida.
“Só tomando nossos pais, conseguimos nos apropriar de nossas vidas”
Veja a nossa página de workshops de constelações familiares, com informações e calendário.
Bibliografia consultada:
Garriga, Bacardí. Joan. “Onde estão as Moedas”. Editora Saberes.
Hellinger, Bert. A simetria Oculta do amor. Ed. Cultrix.
Hellinger, B. Ordens do Amor. Ed. Cultrix.
Hellinger, B. O Amor do Espírito. Ed. Atman.
Franke, Ursula. Quando fecho os Olhos Vejo Você. Ed. Atman.
Espetacular texto!
Gratidão ????????????????
Texto bem interessante!!! E reflexivo. Obrigada!
Muito esclarecedor, chamou especialmente minha atenção essa parte do texto:
Se os seus filhos ficam decepcionados porque não conseguem pintar quadros tão belos, embora não tenham o seu talento e não trabalhem tão arduamente como ela, eles violam as Ordens do Amor.
O mesmo aplica-se à riqueza material. Os filhos que se sentem herdeiros da riqueza dos seus pais e ficam decepcionados quando não o são, danificam as ordens do amor.
Se herdarem a riqueza, o amor só estará bem servido quando a tratarem puramente como uma dádiva e não como um direito.
Basta ter o olhar de dádiva…e tudo estará em ordem…
muito bom este texto, vem reafirmar todas as emoçoes e necessidade de Tomar nossos pais.
Lindo texto, muito profundo. Parabéns
Olá Eliana, bom dia! Tudo bem?
Obrigada por acompanhar nos acompanhar! Em breve, publicaremos novos conteúdos.
Obrigado